terça-feira, 11 de agosto de 2009

GÊNEROS E TIPOS TEXTUAIS - TP3



Ter clara a diferença entre Gênero Textual e Tipologia Textual é importante para nortear o trabalho do professor de língua na leitura, compreensão e produção de textos. Portanto registrei aqui algumas considerações a respeito, usando as considerações feitas por Marcuschi (2002) e Travaglia (2002).
Luiz Antônio Marcuschi (UFPE) defende o trabalho com textos na escola a partir da abordagem do Gênero Textual, para ele, o trabalho com a Tipologia Textual fica limitado, uma vez que não é possível ensinar de modo geral, a narrativa, porque cada gênero narrativo possui diferenças específicas em sua estrutura.
Por outro lado, Luiz Carlos Travaglia (UFUberlândia/MG) defende o trabalho com a Tipologia Textual. Para o autor, sendo os textos de diferentes tipos, eles se instauram devido à existência de diferentes modos de interação ou interlocução. O trabalho com o texto e com os diferentes tipos de texto é fundamental para o desenvolvimento da competência comunicativa.
Marcuschi afirma que os livros didáticos trazem o termo tipo de texto. Para ele, não se trata de tipo de texto, mas gênero de texto. O autor diz que em todos os gêneros os tipos se realizam, ocorrendo, muitas das vezes, o mesmo gênero em dois ou mais tipos. Ele apresenta uma carta pessoal e comenta que ela pode apresentar as tipologias descrição, injunção, exposição, narração e argumentação. Ele chama essa miscelânea de heterogeneidade tipológica.
Travaglia (2002) fala em conjugação tipológica. Para ele, dificilmente são encontrados tipos puros. Num texto como a bula de remédio, por exemplo, que para Fávero & Koch (1987) é um texto injuntivo, tem-se a presença de várias tipologias, como a descrição, a injunção e a predição. Travaglia afirma que um texto se define como de um tipo por uma questão de dominância, em função do tipo de interlocução que se pretende estabelecer.
Quando acontece o fenômeno de um texto ter aspecto de um gênero, mas ter sido construído em outro, Marcuschi dá o nome de intertextualidade intergêneros. Ele explica dizendo que isso acontece porque ocorreu no texto a configuração de uma estrutura intergêneros de natureza altamente híbrida, sendo que um gênero assume a função de outro.
Travaglia não fala de intertextualidade intergêneros, mas fala de um intercâmbio de tipos. Ele afirma que um tipo pode ser usado no lugar de outro tipo, criando determinados efeitos de sentido.
Resumindo esse ponto, Marcuschi traz a seguinte configuração teórica:
a) intertextualidade intergêneros = um gênero com a função de outro
b) heterogeneidade tipológica = um gênero com a presença de vários tipos
Travaglia mostra o seguinte:
a) conjugação tipológica = um texto apresenta vários tipos
b) intercâmbio de tipos = um tipo usado no lugar de outro
Para Marcuschi, Tipologia Textual é um termo que deve ser usado para designar uma espécie de seqüência teoricamente definida pela natureza lingüística de sua composição. Em geral, os tipos textuais abrangem as categorias narração, argumentação, exposição, descrição e injunção (Swales, 1990; Adam, 1990; Bronckart, 1999).
Gênero Textual é definido pelo autor como textos encontrados no dia-a-dia e que apresentam características sócio-comunicativas definidas pelos conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica.
Travaglia define Tipologia Textual como um modo de interação, uma maneira de interlocução, segundo perspectivas que podem variar. Essas perspectivas podem, segundo o autor, estar ligadas ao produtor do texto em relação ao objeto do dizer quanto ao fazer/acontecer, ou conhecer/saber, e quanto à inserção destes no tempo e/ou no espaço. Cada uma das perspectivas apresentadas pelo autor gerará um tipo de texto.
Travaglia diz que o Gênero Textual se caracteriza por exercer uma função social específica. Para ele, estas funções sociais são pressentidas e vivenciadas pelos usuários. Isso equivale dizer que, intuitivamente, sabemos que gênero usar em momentos específicos de interação, de acordo com a função social dele.
Travaglia cita o termo Espécie se define e se caracteriza por aspectos formais de estrutura e de superfície lingüística e/ou aspectos de conteúdo. Ele exemplifica Espécie dizendo que existem duas pertencentes ao tipo narrativo: a história e a não-história. Ainda do tipo narrativo, ele apresenta as Espécies narrativa em prosa e narrativa em verso. No tipo descritivo ele mostra as Espécies distintas objetiva x subjetiva, estática x dinâmica e comentadora x narradora. Mudando para gênero, ele apresenta a correspondência com as Espécies carta, telegrama, bilhete, ofício, etc. No gênero romance, ele mostra as Espécies romance histórico, regionalista, fantástico, de ficção científica, policial, erótico, etc.
Já Marcuschi aborda o conceito de Domínio Discursivo. Ele diz que os domínios discursivos são as grandes esferas da atividade humana em que os textos circulam (p. 24). Esses domínios não seriam nem textos nem discursos, mas dariam origem a discursos muito específicos. Constituiriam práticas discursivas dentro das quais seria possível a identificação de um conjunto de gêneros que às vezes lhes são próprios, como práticas ou rotinas comunicativas institucionalizadas. Como exemplo, ele fala do discurso jornalístico, discurso jurídico e discurso religioso. Cada uma dessas atividades, jornalística, jurídica e religiosa, não abrange gêneros em particular, mas origina vários deles.
Semelhante opinião entre os dois autores citados é notada quando falam que texto e discurso não devem ser encarados como iguais.
Marcuschi considera o texto como uma entidade concreta realizada materialmente e corporificada em algum Gênero Textual. Discurso para ele é aquilo que um texto produz ao se manifestar em alguma instância discursiva. O discurso se realiza nos textos.
Travaglia considera o discurso como a própria atividade comunicativa, a própria atividade produtora de sentidos para a interação comunicativa. Texto é o resultado dessa atividade comunicativa. O texto, para ele, é visto como uma unidade lingüística concreta que é tomada pelos usuários da língua em uma situação de interação comunicativa específica. Travaglia afirma que distingue texto de discurso levando em conta que sua preocupação é com a tipologia de textos, e não de discursos. Marcuschi afirma que a definição que traz de texto e discurso é muito mais operacional do que formal.
Podemos observar que as discussões feitas por Marcuschi a partir dos Gêneros Textuais, estão diretamente ligadas ao ensino. Ele afirma que o trabalho com o gênero é uma grande oportunidade de se lidar com a língua em seus mais diversos usos autênticos no dia-a-dia. Cita o PCN, dizendo que ele apresenta a idéia básica de que um maior conhecimento do funcionamento dos Gêneros Textuais é importante para a produção e para a compreensão de textos. O que Travaglia mostra é uma extrema preferência pelo uso da Tipologia Textual, independente de estar ligada ao ensino.
Marcuschi diz que não acredita na existência de Gêneros Textuais ideais para o ensino de língua. Ele afirma que é possível a identificação de gêneros com dificuldades progressivas, do nível menos formal ao mais formal, do mais privado ao mais público e assim por diante.
Até recentemente, o ensino de produção de textos (redação) era feito como um procedimento único e global, como se todos os tipos de texto fossem iguais e não apresentassem determinadas dificuldades. A fórmula de ensino de redação, ainda hoje muito praticada nas escolas brasileiras – que consiste fundamentalmente na trilogia narração, descrição e dissertação – tem por base uma concepção voltada essencialmente para duas finalidades: a formação de escritores literários ou a formação de cientistas.
O ensino-aprendizagem de leitura, compreensão e produção de texto pela perspectiva dos gêneros reposiciona o verdadeiro papel do professor de Língua Materna hoje, não mais visto aqui como um especialista em textos literários ou científicos, distantes da realidade e da prática textual do aluno, mas como um especialista nas diferentes modalidades textuais, orais e escritas, de uso social. Assim, o espaço da sala de aula é transformado numa verdadeira oficina de textos de ação social. A avaliação dessas produções abandona os critérios quase que exclusivamente literários ou gramaticais e desloca seu foco para outro ponto: o bom texto não é aquele que apresenta, ou só apresenta características literárias, mas aquele que é adequado à situação de comunicação para a qual foi produzido, ou seja, se a escolha do gênero, se a estrutura, o conteúdo, o estilo e o nível de língua estão adequados ao interlocutor e podem cumprir a finalidade do texto.
Quando refletimos sobre as propostas de gêneros textuais nas aulas de língua materna, temos em mente a grande importância e significado de se obter cidadãos capazes de lidar com diversas formas de discurso em seu meio social. Daí a necessidade de um ensino que venha atender às necessidades discursivas em meio a uma sociedade tecnológica.
Convém afirmar que o trabalho com a leitura, compreensão e a produção escrita em Língua Materna deve ter como meta primordial o desenvolvimento no aluno de habilidades que façam com que ele tenha capacidade de usar um número sempre maior de recursos da língua para produzir efeitos de sentido de forma adequada a cada situação específica de interação humana.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTUNES, I. (2004). Aula de português: encontros e interação. São Paulo: Parábola.
BRONCKART, J.-P. (1999). Atividades de linguagem, textos e discursos. Por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Editora da PUC/SP.
FÁVERO, L. L. & KOCH, I. V. (1987). “Contribuição a uma tipologia textual”. In Letras & Letras. Vol. 03, nº 01. Uberlândia: Editora da Universidade Federal de Uberlândia. pp. 3-10.
MARCUSCHI, L. A. (2002). “Gêneros textuais: definição e funcionalidade” In DIONÍSIO, Â. et al. Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna.
TRAVAGLIA, L. C. (1991). Um estudo textual-discursivo do verbo no português. Campinas, Tese de Doutorado / IEL / UNICAMP, 1991. 330 + 124 pp.

2 comentários:

  1. Marcuschi define gêneros, define tipos textuais, deixa claro a diferença entre um e outro e ressalta a importância dos gêneros. Mas não há nenhuma citação literal neste texto que comprove que Marcuschi é a favor do ensino de gêneros textuais em sala de aula, como vc diz que ele defende.

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